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Felix Marquardt: Davos deveria voltar sua atenção para a crise geracional do mundo

Felix Marquardt

Durante a abertura do Fórum Econômico Mundial em Davos, um tema de discussão já emergiu com bastante força: os jovens estão sofrendo, e numa escala global.

Eles foram empobrecidos pela crise financeira mundial, e em vários países – especialmente os mais ricos – seus números estão minguando. A legitimidade democrática vem declinando e um afastamento generalizado entre a juventude e a política formal continua a crescer. Muitos parecem ter se acostumado a serem maltratados – um número crescente deles não quer nem saber de votar – e uma tempestade se forma. O próximo grande conflito pode não ser de civilizações, religiões ou culturas, mas de gerações.

Os jovens entendem instintivamente que o maior problema do mundo é de governança, e em sua raiz está o Estado-nação. A invenção do Estado-nação se arrastou por séculos, e ele não vai desaparecer tão rapidamente. Nem deveria. O Estado desempenha um papel estruturante ao auxiliar os seres humanos a evoluir de uma identidade familiar, tribal ou regional para um conceito mais amplo de pertencimento.

Ele é, contudo, uma fase de nosso desenvolvimento e deveria ser visto como tal, em vez de um onipotente fim de toda governança.

Os jovens têm plena consciência da ingênua esperança de que líderes eleitos para mandatos de quatro a oito anos resolvam problemas de longo prazo, tais como o aquecimento global ou o dilema da juventude, de forma adequada. Eles entendem muito bem que, por definição, interesses nacionais são específicos demais para carregar tanto peso.

Uma vez que as soluções para os problemas mais graves do mundo nos próximos anos serão transnacionais, as pessoas precisam se mudar. Historicamente, os migrantes provaram ser os povos mais inovadores e criativos na busca de solução para problemas culturais e tecnológicos. Quando as pessoas se mudam, levam consigo as melhores ideias de um lugar e as adaptam às práticas de outro. Isso não quer dizer que populações sedentárias não sejam inventivas, mas que os migrantes possuem uma visão particular que coloca práticas regionais em perspectiva, e conseguem criticá-las e analisá-las de uma forma mais aberta à mudança.

A maioria dos jovens no mundo, contudo, está presa dentro de barreiras nacionais. Para superá-las, devemos estabelecer um visto global para a juventude que permita jovens de qualquer país se candidatar a integrar um grupo autorizado a trabalhar no país de sua escolha por até dois anos. Só assim começaremos a criar os cidadãos globais de que o mundo tanto precisa.

Quanto à governança, as soluções reais virão de entidades transnacionais formadas por representantes da sociedade civil selecionadas de acordo com características geográficas, gerativas e de gênero em vez de aspectos nacionais. Experimentos nesse campo já começaram. A assembleia de cidadãos da Colúmbia Britânica sobre reforma eleitoral, composta por 160 cidadãos selecionados “semi-aleatoriamente” foi estratificada de acordo com idade e sexo.

Na Islândia, após a crise financeira de 2008 e da “revolução das panelas”, o governo estabeleceu uma assembléia nacional para escrever uma nova constituição. O Parlamento escolheu 100 pessoas ao acaso a partir do cadastro nacional, utilizando amostragens estratificadas para garantir o equilíbrio de gênero, idade e de região nas discussões acerca do que deveria ser incluído na nova constituição.

Foi formado um conselho constitucional com 25 membros, que incluiu uma diversa seleção de cidadãos, dentre eles um fazendeiro, um padre, uma enfermeira, um filósofo e um diretor de teatro, além de advogados, cientistas políticos e políticos, todos com a incumbência de escrever uma constituição. Uma interface online permitia ao público ler e fazer comentários acerca dos procedimentos. O conselho aprovou o projeto de lei final por unanimidade em apenas quatro meses.

É claro que esses exemplos são de valia limitada, mas possuem grande importância, e a tecnologia os torna cada vez mais escaláveis. Os jovens reagem de maneira diferente a mudanças climáticas e a vários assuntos globais. Sua perspectiva é menos interessada em aspectos nacionais. Eles não são candidatos a reeleição. Não possuem ações em grandes petrolíferas ou empresas de frete global.

Isso tampouco é apenas sobre a juventude em si. Nosso futuro reside nas mãos da geração Y, que terá o dever de adotar políticas complexas criadas por pessoas que morreram bem antes de vê-las em prática. Se eles não concordarem com essas regras, elas simplesmente não serão implementadas. Mecanismos como um visto global para a juventude e votações transnacionais baseadas em padrões geográficos, gerativos e de gênero em vez de simplesmente nacionais nos ajudarão a empoderar os jovens e a torná-los parte dessas soluções.

* Felix Marquardt é o fundador dos think tanks Youthonomics e mYgration.com.
** ** As opiniões apresentadas nesse artigo são de responsabilidade do seu autor. 

Tradução de Emiliano Diogenes Abreu