Luciano Frontelle: Desafio geracional – É hora de superar os preconceitos e agir

Desenho sem título (5)

Para surpresa de alguns e nem tanto para outros, Greta Thumberg é eleita a personalidade do ano pela revista TIME – uma publicação especial da revista que destaca o perfil uma pessoa, casal, grupo, ideia, lugar ou máquina que para o bem ou para o mal, mais influenciou os eventos do ano. Com 16 anos, ela foi a pessoa mais nova a ser reconhecida sozinha desde início da publicação, em 1927. A jovem ficou famosa por virar ícone de uma geração que se cansou da falta de ação de líderes políticos frente a crise climática que vivemos e resolveu tomar as ruas em um movimento que ficou conhecido como Sextas Pelo Futuro (Fridays for Future, em inglês). Na sexta do dia 27 de setembro de 2019, quando ficou marcado o dia da Greve Global pelo Clima, cerca de 6 milhões de pessoas, na sua maioria jovens e crianças, tomaram as ruas no mundo todo.

Na mesma semana, Sanna Marin assumiu o mais alto cargo político da Finlândia como Primeira Ministra do país. Ela tem 34 anos e é a líder de estado mais nova do mundo atualmente. Ela compõe o parlamento desde 2015, foi ministra dos transportes e agora representa uma coalizão de 5 partidos, todos liderados por mulheres, quatro delas com menos de 35 anos. No Brasil isso não seria possível, de acordo com a nossa constituição, a pessoa precisa ter no mínimo 35 anos para assumir a presidência, o equivalente ao cargo de Primeira Ministra. Bolsonaro foi eleito presidente com 64 anos.

Olhando pro restante do mundo, com dados de 2017, a média de idade dos líderes políticos dos países era de 62 anos, o que é bem diferente da média de idade global, que apesar de estar envelhecendo, era de 29,6 em 2015 e tem previsão de ser 30,9 em 2020.

Nosso congresso, apesar de ter aumentado o número de representantes mais novos na última eleição, ainda tem uma média de 49 anos de idade para a Câmara e 56 anos no Senado.  A média de idade da população brasileira é de 32,6 anos, ou seja, acompanhamos o contraste global entre representantes e representados, apesar de ser em uma margem de diferença um pouco menor.

Com isso podemos notar que apesar de pessoas mais novas estarem conquistando lugares de destaque, nosso mundo ainda é liderado por pessoas mais velhas que a maioria da nossa população. O que isso significa ou por que é importante?

Aqui, vamos olhar para a questão conectada com a Greta, a crise climática. A agenda climática prevê metas para os próximos 30 anos, dentro do Acordo de Paris. Isso, por si só, traz dois desafios que podem ser facilmente verificados a partir das falas ou projetos de líderes de estado em sua maioria.

Não é assim que estamos acostumados a fazer política

Na maioria dos sistemas democráticos do mundo, líderes de governo possuem mandatos curtos, separados por eleições regulares que variam de país para país. Isso quer dizer que a maioria das propostas apresentadas durante campanhas ou formuladas em governos são decididas para serem executadas durante seu mandato. Uma agenda de 30 anos não é compatível com esse sistema.

A maioria dos políticos não sofrerão as consequências

Olhando novamente para os dados etários e fazendo um comparativo com a expectativa de vida global, é bem provável que a maioria dos líderes políticos que temos hoje não estarão aqui para ver o que de fato acontecerá daqui 30 anos – apesar de existirem milhares de estudos científicos que fazem as projeções e justificam a importância de ação climática agora.

Sendo assim, a pauta climática acaba passando longe da maioria das agendas de líderes globais, ou quando aparece, não tem a ambição que precisamos para de fato solucionarmos o problema.

Veja.

No Acordo de Paris, os países acordaram que o aumento da temperatura média do planeta deve ficar bem abaixo de 2ºC, idealmente não passando de 1,5ºC, em relação à média de temperatura do período pré-industrial.

Só que quando olhamos para os compromissos que cada país declarou assumir para si mesmo, mesmo se todos cumprirem suas metas de redução de emissões, as previsões demonstram que a média de temperatura do planeta pode subir 3,2ºC até 2060.

O G20 é responsável por 75% das emissões globais de gases de efeito estufa, mas apenas cinco assumiram o compromisso com uma meta de emissões zero para 2050.

“Minha geração falhou em responder adequadamente ao desafio dramático das mudanças climáticas. Isso é sentido profundamente pelos jovens. Não é de admirar que eles estão com raiva.”, declarou o Secretário-Geral das Nações Unidas, Antonio Gutierres.

O preconceito etário

Tanto jovens quanto idosos sofrem preconceitos por causa da idade. No caso dos mais jovens, são chamados de imaturos, insubordinados e irresponsáveis. As pessoas mais velhas costumam ouvir que são fracos, lentos e dependentes.

Aqui vamos falar do que é direcionado aos jovens. O caso que ganhou a mídia essa semana, foi o do Bolsonaro, um chefe de estado, se dirigir a uma ativista como “pirralha”. Um termo pejorativo referente a idade de Greta. Ele não foi o único a tentar destratar a sueca com base em sua idade, é fácil encontrar na internet comentários que tentam deslegitimar a importância do que ela diz porque “é muito nova”.

Esse não é um caso isolado, há muito tempo movimentos de juventudes no mundo todo demandam espaço junto às mesas de decisão para que também possam opinar em pé de igualdade sobre assuntos que irão afetar diretamente suas vidas. No Brasil, foi apenas em 2010, via uma emenda à constituição federal, que o termo “juventude” foi incluído no texto. O que quer dizer que antes disso as juventudes não eram reconhecidas como sujeitos de diretos, com suas especificidades e políticas próprias.

Quando jovens são candidatos/as, é comum também ver esses ataques baseados em idade, ao invés de debater o mérito de suas propostas, se debate a capacidade daquela pessoa de poder ou não assumir a responsabilidade da função ou se estão preparados/as o suficiente.

As juventudes não vão resolver tudo

Pelo menos não sozinhas. Além disso, não é justo jogar toda a responsabilidade dos desafios atuais em apenas uma geração, algo que pode ser exemplificado pela frase muito usual dita por políticos “os jovens são o futuro” ou “vocês irão salvar o mundo”.

“A Crise Climática já foi resolvida. Nós já temos todos os fatos e soluções. Tudo que nós precisamos fazer é acordar e mudar.” – Greta Thunberg

O que nós precisamos é que possamos focar o debate no que interessa: soluções ambiciosas que possam ajudar as próximas gerações a terem acesso a um meio ambiente socialmente justo e ambientalmente equilibrado.

Para isso, é necessário e estratégico fazer um debate intergeracional que conte com participação significativa das juventudes, respeitando suas ideias e co-construindo com elas as políticas que precisamos.

 

Luciano Frontelle é Diretor Executivo na Plant-for-the-Planet Brasil. Acompanha as negociações das Nações Unidas desde em desenvolvimento sustentável e clima desde 2012. Foi convidado e/ou selecionado para conferências sobre esses processos na Indonésia, Bélgica, Sri Lanka, Peru, Estados Unidos, França, Marrocos e Alemanha. Em 2016 foi destaque na edição de aniversário da revista Época como um dos 30 jovens abaixo de 30 envolvido em ações que vão mudar o país.

 

Nota: As opiniões apresentadas nesse texto são de total responsabilidade de seu autor