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Juventude debate economia solidária no Fórum Social Mundial

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A UNISOL SP, juntamente com a representação da Associação Cultural e Educacional Movimento Hip Hop Revolucionário, Empreendimento filiado a UNISOL Brasil esteve presente no Fórum Social Mundial, propondo e participando de atividades auto-gestionadas e pautando a Economia Solidária como estratégia de desenvolvimento e alternativa na construção de uma sociedade mais justa, solidária e educadora. Em uma manhã de janeiro em mais um dia terrivelmente quente. Os relógios ainda não batiam 10h da manhã quando o termômetro já indicava 30 º em Porto Alegre. Ali, no Parque Redenção, antigamente conhecido como Parque Farroupilha em homenagem ao centenário da histórica Guerra dos Farrapos, acontecia a abertura do 15º Fórum Social Mundial. A edição temática buscou em todo o seu roteiro fazer um balanço dos quinze anos deste tão importante evento para as pautas progressistas em tempos sombrios, onde a parcela mais reacionária e fascista sai de seus armários, na tentativa de desconstrução de tantos importantes avanços para as camadas mais vulneráveis de uma adolescente democracia, avaliando a conjuntura política nacional e internacional e procurando, quem sabe, iniciar novas articulações com outros movimentos sociais. Para esta edição foram esperadas cerca de 10 mil pessoas, embora o número de países participantes tenha caído com relação ao evento inicial, em 2001. Naquele ano, 4.702 pessoas de 117 países passaram por Porto Alegre para participar do primeiro Fórum, que aconteceu em contraposição ao Fórum Mundial de Davos, em 2001. Contrários às políticas neoliberais praticadas ao longo dos anos de 1990 e 2000 na América Latina, na América Central e na África, os militantes sociais se reuniram em Porto Alegre para discutir mudanças e desenvolver laços que fossem suficientemente fortes para sustentar o slogan “um outro mundo possível”.

A abertura singela, realizada numa tenda, foi conduzida por uma roda de conversa envolvendo o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, o educador popular Oscar Jara e a representante do Movimento Sem Terra (MST), Gislei Siqueira Knierim. Pautada sobre os saberes populares na produção de conhecimento e na sistematização dos saberes, a mesa discutiu temas importantes como subjetividade dos militantes, construção de consciência política coletiva e possibilidades de cenários políticos futuros para o Fórum Social Mundial.  Jara fez uma pontuação assertiva sobre o tema: sistematizar conhecimento não seria apenas documentar as ações tomadas. A sistematização das práticas de coletivos e grupos políticos deve permitir e convidar a reflexão de maneira distanciada e objetiva. Segundo Jara, a sistematização dos saberes populares deve melhorar a experiência; compartilhar aprendizados e não apenas narrativas; incidir em políticas públicas e fortalecer a identidade coletiva, à medida que proporciona a construção de traços comuns e compartilha experiências. Afirma que “a utopia não está longe” e está relacionada com hábitos cotidianos. “Às vezes vamos atrás das utopias e não percebemos a força que nos move até ela, a força e o conhecimento interno do nosso coletivo”, segundo ele, este resgate de forças é importante para seguir na luta.

Gislei Siqueira Knierim por sua vez, traçou paralelos entre o materialismo dialético, Antonio Gramsci e Paulo Freire como precussores da sistematização do conhecimento e da formação do intelectual orgânico em uma comunidade. Trabalhando com a subjetividade dos sujeitos militantes, seria possível, segundo Gislei, construir coletivos de pensamento e não mais pensamentos coletivos, estimulando a criticidade e a construção de novas ideias promissoras.

Entre outras falas, Boaventura dos Santos começa seu discurso reafirmando um preceito que ainda tangenciava o debate: o academicismo versus a práxis militante. Segundo o professor Boaventura, o saber popular precisa do saber acadêmico e vice-versa. Como complementares ideológicos, academia e movimentos sociais devem também ser complementares em suas plataformas de atuação, desta maneira, a sistematização atingiria seus objetivos de contextualizar, informar e criar possibilidades para os movimentos sociais. A metodologia é apenas uma metodologia se não houver uma finalidade prática e política em sua escolha. Desta maneira, sistematizar saberes populares deve ser apenas um meio de possibilitar o surgimento de novas sensibilidades aos movimentos sociais populares. Boaventura pontua ainda que “depois de sistematizar, é preciso dessistematizar, desobjetivar e destruir o que foi feito a fim de construir percepções novas e exercitar a imaginação política do povo”. Ao imaginar cenários possíveis, atores sociais viáveis e identificar fraquezas nos processos apreendidos ao longo da militância, os movimentos sociais podem se revigorar e incorporar novos agentes.

Durante a tarde, o ato de abertura e a Marcha pela Paz reuniu cerca de 2 mil pessoas com bandeiras de diversas entidades indígenas, de mobilidade urbana e habitação social, além de contar com integrantes e grupos do movimento feminista, movimento negro e cultura Hip Hop, entre outros. O ato saiu da concentração realizada em frente ao Mercado Público e à prefeitura e caminhou até o Largo do Zumbi, ponto central e simbólico para o evento. Dentre as falas políticas da marcha, destacam-se a presença do ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rosseto, além de representantes da União Nacional de Estudante (UNE) e da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Logo após, show de rap com Moisés MC, um cantor que não desistiu do rap mesmo após graves acidentes que o deixaram paraplégico. Naiara Navalta, representante da Marcha Mundial das Mulheres afirma que a organização veio ao Fórum para facilitar o diálogo e articulação com outros movimentos, mas sempre centrada na autonomia econômica no direito reprodutivo das mulheres. Diante do recrudescimento de direita no país, Naiara afirma que a preocupação da Marcha, sobretudo nesta edição, é disputar territórios dentro da luta de classes e de gênero no Fórum, a fim de se articular politicamente para resistir aos avanços que lesam as mulheres trabalhadoras no Brasil e no mundo.

No segundo dia de atividades do Fórum Social Mundial de Porto Alegre e depois de anos de disputa política, finalmente há espaço para uma tenda permanente de Hip Hop no evento. Desde 2001, a Cultura Hip Hop em Movimento Social e Político procura garantir a representatividade do movimento no Fórum e para comemorar a conquista, organiza no Fórum atividades com um forte recorte de gênero, raça/etnia e como única possibilidade viável a economia solidaria e o cooperativismo com possibilidade viável para a qualificação na produção, distribuição e gerenciamento de produtos e serviços culturais. A atividade auto-gestionada começou na quarta-feira, 20 de janeiro, pela manhã no Parque Redenção. A partir disto, foi remontado o cenário Hip Hop da cidade dos últimos 10 anos, especialmente no que diz respeito à participação equitativa da mulher, do (a) homossexual e da auto-gestão no Hip Hop. Remontando na narrativa uma época, quando dançar break, cantar Rap, escrever Graffiti e discotecar ainda era visto como uma ação insubordina, marginal (sempre no pejorativo da palavra) e feita por pessoas sem perspectivas e contra o contrato social colocado pela burguesia.

Durante a manhã, militantes do Estado contribuindo para o debate, levando perspectivas sobre a academia e a dança de matrizes africanas na Universidade, bem como o apelo pelo break nas periferias da cidade. Betinho Zulu, membro da Cooperativa de Arranjos Produtivos e Comercio Justo e Solidário Rede Nacional das Casas da Cultura Hip Hop também esteve presente, levantando questões históricas do Hip Hop e seus elementos, bem como a participação das mulheres no movimento, ainda que com frequência sejam silenciadas, esquecidas e diminuídas pela história – quase sempre contada por homens. Questionado sobre a invisibilidade histórica das mulheres no movimento, Betinho lembrou a companheira Dina Di e Baby Love como grandes ícones do movimento no Brasil e Cindy Campbell, irmã de Kool Herc e uma das idealizadoras do movimento, responsável pela organização das festas no Brooklyn dos anos de 1970. A lembrança, ainda que simbólica e importante, não é suficiente para abarcar a história de tantas e tantas mulheres que contribuíram enormemente para a organização do Hip Hop como cultura e movimento social ao longo da história. Outra grande militante histórica da Cultura Hip Hop no Brasil Malu Viana destaca ainda que muitas militantes do movimento “são enterradas vivas”, esquecidas pelos companheiros e apagadas pelo machismo que corrói o movimento de dentro. A colocação é importante a medida que aponta erros e falhas generalizadas no Hip Hop, que como movimento social vivo, rico e orgânico possui estruturas complexas de relacionamento e naturalmente reproduz determinadas relações de poder existentes na sociedade brasileira. Como movimento social e cultural de resistência, o Hip Hop também está apto a se ressignificar, ampliar suas lutas e assimilar mudanças na sociedade. Assim como fez com a tecnologia, o Hip Hop pode e deve incorporar de vez a luta pela igualdade de gênero como uma questão tão estrutural e identitária quanto a luta contra o racismo e contra a criminalização da pobreza, além da economia solidária como grande e única estratégia de desenvolvimento. Logo após ocorreram oficinas de break e dança contemporânea, atendendo crianças, jovens e adultos na tenda numa tarde de descontração e música. No final do dia, foi realizada a primeira batalha de b.girls do Fórum Social Mundial 2016. Com a participação de três juradas especialmente convidadas para o evento, duas garotas competiram pelo troféu Baby Love, em homenagem a outra importante b.girl do movimento dos anos de 1980 em São Paulo. A tenda se converteu rapidamente num Fórum Permanente do Hip Hop, presente durante todo Fórum Social Mundial, trazendo histórias e perspectivas para o futuro do movimento local, que ainda tem muito a crescer e se ampliar, mas que está no caminho certo para fazer desta tenda no evento internacional apenas um ponto de partida, jamais o ponto de chegada.

* Bob Controversista – Diretor de Cultura UNISOL São Paulo; Presidente na Associação Cultura e Educacional Movimento Hip Hop Revolucionário – MH2R; Presidente na Cooperativa de Arranjos Produtivos e Comercio Justo e Solidário Rede Nacional das Casas da Cultura Hip Hop

** As opiniões apresentadas nesse artigo são de responsabilidade do seu autor.