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Daniel Vaz: Precisamos de justiça, não de justiceiros
Sede de acerto de contas por parte da sociedade com Lula permitiu ao juiz Sérgio Moro avançar um sinal perigoso para o Brasil. Justiçamento é prática comum que penaliza o povo da periferia. Cadê o Amarildo?
Vivemos um histórico 4 de março de 2016, dia em que ocorreu a condução coercitiva do ex-presidente Lula em uma operação que envolveu 200 agentes da Polícia Federal para levá-lo de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, até o aeroporto de Congonhas, para ser ouvido na 24ª etapa da Operação Lava-Jato.
Alguns comemoraram como se fosse a prisão do Gibson, líder da facção da novela A Regra do Jogo, da Rede Globo de Televisão, aquela que vem justamente depois do Jornal Nacional, que na quinta, dia 3, teve mais de 1 hora de duração, “preparando” a população de maneira calculada, para lançar a notícia da condução à força do ex-presidente Lula, informação vazada na madrugada do fato ocorrido pelo ansioso diretor da revista Época, parte do mesmo grupo editorial.
Uma outra parte significativa, maior do que simplesmente “petistas apaixonados”, vem criticando a medida tomada, que pode desencadear um embate político de consequências imprevisíveis. Ex-ministros do governo de FHC, os dois mais importantes jornais de São Paulo, o Ministro Marco Aurelio Mello, do Supremo Tribunal Federal, e outras organizações e personalidades começaram a se manifestar contrariamente ao que foi entendido como uma violação ao Estado Democrático de Direito.
Esse é um conceito que segue vigente desde a Grécia Antiga, ele determina que qualquer lugar onde ele se aplica (como o Brasil) deve a garantir o respeito das liberdades civis, os direitos humanos e as garantias fundamentais, através do estabelecimento de uma proteção jurídica. Nessa condição, as próprias autoridades estão sujeitas ao respeito a esse princípio.
Ter sido levado a depor dentro das circunstâncias em que ocorreu o fato, leva a uma suposição de que esse ato teve uma finalidade muito mais política, com os olhos em uma possível candidatura presidencial em 2018, numa mistura de ação judicial com ato midiático desnecessária para o processo democrático, que buscou atingir simbolicamente esse personagem da política brasileira.
Medidas de exceção como essa não devem ser defendidas por quem se diz partidário da democracia, por maior que seja o ódio de uma parcela da sociedade brasileira a essa figura política que é Lula, e a falta de rumo do governo de Dilma, que não colabora para que esse 2016 seja melhor que o sofrido 2015 que tivemos. Essa situação de crises política e econômica não pode ser agravada com a promoção de iniciativas que colaborem com esse cenário de caos injustificável, criando-se fatos que vão para a esfera da política brasileira, buscando agir em nome de algo que não é justiça, é acerto de contas. É, de fato, “jogar para a platéia”.
Claro que esse abuso de autoridade não é o primeiro, nem será o último a acontecer, em muitos casos a cidadania é afetada de maneira mais grave do que a condução coercitiva abusiva praticada contra Lula, que, por ser um ex-presidente e estar em evidência, é vigiado dia e noite pela imprensa, opositores e aqueles que torcem pelo seu ocaso. Na periferias das grandes cidades, milhares de cidadãos continuam e ser conduzidos de forma coercitiva, muitas vezes sem saber se retornarão para suas residências, como foi o caso do desaparecimento de Amarildo Dias de Souza, ocorrido no Rio de Janeiro em 2013, crime até hoje sem punição dos culpados. O desrespeito aos seus direitos humanos chamam menos atenção, em grande parte das vezes são encarados como simplesmente efeitos colaterais da guerra à violência urbana existente principalmente nas médias e grandes cidades brasileiras.
Tomara que a Polícia Federal e outras forças de Estado consigam ampliar as formas de combater a corrupção e os desmandos que nos atingem cotidianamente. Para que isso seja feito com equilíbrio, a sociedade precisa querer mais justiça do que vingança. Investigações devem seguir e culpados devem pagar pelo que fizeram também em casos que envolvam os adversários do PT, em muitas vezes usaram rigorosamente os mesmos métodos pelos quais pessoas ligadas a esse partido estão sendo punidas.
Há muito tempo que o Brasil precisa de justiça para todos, a quem merece reparação ou punição. Como muito disseram nos últimos dias, ninguém está acima da lei, nesse caso, nem o ex-presidente Lula, os policiais assassinos de Amarildo e de tantos outros provenientes das periferias; muito menos o detentor da toga, que deve zelar pelo bom cumprimento delas, o juiz Sérgio Moro.
* Daniel Vaz é publicitário, Mestre em Comunicação, fundador da ONG Opção Brasil, e representa a mesma na Secretaria Executiva da Seção Brasileira de Participação Social da Unasul – União Sul-Americana de Nações, e Mercosul – Mercado Comum do Sul. Desempenha também as funções de Coordenador-geral da UNIJUV – Universidade da Juventude e de Vice-presidente da AUALCPI – Associação das Universidades da América Latina e Caribe pela Integração.
** As opiniões apresentadas nesse texto são de responsabilidade do seu autor.