Para continuar vindo para a rua

Foto: Leo Lima

Foto: Leo Lima

por Leonardo Custódio*

Muita gente está vibrando com a redução das tarifas como se fosse a grande vitória das manifestações populares das últimas semanas. É claro que é uma festa justa: é muito raro ver governantes sem-graça sendo forçados especialmente pela juventude a mudar decisões.

Mas para mim, a vitória mesmo foi outra: o #vemprarua. As pessoas saíram em massa do conforto da cadeira do computador pra se juntar à militantes que já tomavam praças e esquinas para mudar o país. Mas esse também é o grande desafio para daqui em diante: como manter movimentada a via que liga as redes sociais às ruas e avenidas das cidades?

Tem gente por aí dizendo que o #vemprarua é coisa inspirada pelo comercial de uma montadora de automóveis. Mas você jovem que já era engajado em ações populares aí na sua cidade ou na internet sabe que isso não é verdade.

Por exemplo, há pelo menos dois anos eu acompanho bem de perto a militância de jovens que moram em favelas no Rio de Janeiro. E durante todo esse tempo, um dos lemas para mobilização que a galera mais usa é: “vem pra rua, morador!”. E isso é gritado não só pelas redes sociais, mas nas vielas das favelas em dias de manifestação seja por melhor qualidade de vida, seja contra violência policial. A diferença no caso das manifestações que pararam várias cidades no país é o número de pessoas que resolveram de fato ir pra rua.

Neste sentido, outra hashtag popular que é bem problemática é #ogiganteacordou. Na verdade, a militância e as mobilizações sempre existiram principalmente entre os jovens. Se você está aqui no Infojovem lendo este texto provavelmente já participou ou conhece alguém que tenha participado em algum tipo de mobilização popular, seja na net ou nas ruas.

Ano passado, por exemplo, durante a Cúpula dos Povos no período da Rio +20, eu e muitos de vocês estavam na passeata que reuniu centenas de milhares de jovens e adultos de partidos políticos, movimentos sociais, grupos estudantis, coletivos e cidadãos individuais na mesma Avenida Rio Branco tomada na última segunda-feira aqui no Rio. Só que no ano passado, era basicamente cada grupo defendendo sua própria bandeira e ideologia.

A surpresa esse ano foram tantas pessoas de tantos grupos sociais e políticos diferentes protestarem juntos. Pra mim, foram dois motivos pra essa união ideológica.

O primeiro é que as tarifas foram o elo que fez com que tanta gente se unisse por um objetivo específico. Os preços afetam a maioria diretamente independente das classes sociais e ideologias políticas. Talvez a dor no bolso tenha sido a razão para que tanta gente saísse das redes sociais para as ruas. Afinal, acordados muitos já estavam. O que fizeram foi finalmente sair do conforto e agir.

O segundo motivo eu acredito que tenha sido a confiança para buscar a legitimidade nas ruas. Quem usa redes sociais sabe: nós temos muito mais cara para dizer, fazer e acontecer quando estamos online do que quando estamos em algum lugar. E não se engane: tudo o que dizemos e fazemos online é verdadeiro e tem muito valor. Por exemplo, vários movimentos, petições, campanhas e ações foram muito importantes para gerar debates cruciais na sociedade brasileira. Não teríamos discutido Belo Monte ou o Ficha Limpa se não fossem as discussões organizadas nas redes sociais.

Mas é na rua que determinadas manifestações se legitimam. É da rua lotada de jovens e adultos, em paz ou quebrando tudo, que os políticos mais têm medo de confrontar. Mas ao mesmo tempo, muitos temos vergonha ou medo de levar nossas ideias revolucionárias para fora de nossas cabeças ou para além dos nossos perfis online. E no caso das manifestações das últimas semanas, muito mais gente percebeu que a luta não só pelas tarifas, mas por direitos, não seria tão eficaz se não fossemos para as ruas. É a rua lotada, parada e barulhenta que de fato desperta os que dormem para lutar contra os tantos problemas do país.

Por fim, é pensando no #vemprarua como a principal vitória das últimas semanas que fica o maior desafio: como manter o movimento forte, tanto online quanto offline, depois do sucesso da pressão pela redução das tarifas? Pra isso eu não tenho resposta. Mas hoje eu vou sair pra manifestação com minha bandeira pessoal por mais transparência nas decisões políticas e por mais justiça social. E já vi no Facebook que não vou estar sozinho lá na Candelária: tem mais gente lutando por isso e muito mais. E você? Qual vai ser sua estratégia para usar as redes sociais e contribuir com sua presença na próxima das muitas manifestações que vão parar o país para o continuar transformando?

Leonardo Custódio* é mestre em Ciências Sociais e doutorando em Comunicação, Universidade de Tampere, Finlândia. Atualmente pesquisa os aspectos offline do ativismo através da Internet feito por jovens moradores de favelas do Rio de Janeiro.  Contato: [email protected]